Filiação em Famílias LGBTQIAPN+: Quem Vai no Registro de Nascimento?
- Patrícia de Castro

- há 7 dias
- 15 min de leitura
Multiparentalidade, dupla maternidade e dupla paternidade descomplicadas

Quando nasce um bebê, nasce uma família (de muitos jeitos!)
Quando nasce um bebê, nasce também uma família — e essa família pode ter dois pais, duas mães, três responsáveis ou qualquer outra forma que o amor decidir.
As famílias LGBTQIAPN+ sempre existiram, mas só nos últimos anos começaram a ser visíveis, reconhecidas e, principalmente, respeitadas pelo direito brasileiro.
E com esse reconhecimento surge uma dúvida que aparece em praticamente todas as consultas no escritório e nos comentários do canal Ohana:
Quem Vai no Registro de Nascimento?
A verdade é que, apesar dos avanços, ainda há muita confusão, mito e medo desnecessário sobre como funciona o registro civil para casais homoafetivos, famílias pluriparentais e arranjos familiares que não cabem no “modelo tradicional”
Por isso, este artigo é um convite: vamos conversar sobre filiação com simplicidade, acolhimento e sem juridiquês, do jeitinho leve que você já conhece da Ohana Direito das Famílias.
Aqui, você vai encontrar respostas atualizadas, exemplos reais e orientações práticas para entender como funciona o registro de nascimento em famílias LGBTQIAPN+, inclusive quando há mais de dois responsáveis.
Porque, no fim das contas, família é quem ama, quem cria e quem cuida — e a lei está, cada vez mais, aprendendo a reconhecer isso.
O que é filiação?
Filiação é, de forma simples, o laço que conecta pais, mães e filhos aos olhos da lei.
É como se o ordenamento jurídico dissesse: Vocês são família, e todos os direitos e responsabilidades estão garantidos.
Mas aqui vai o ponto mais importante: filiação não é só genética. E isso muda tudo no Direito das Famílias moderno.
Filiação biológica
É a mais conhecida: aquela baseada na genética. Mas o fato de haver “DNA compatível” não é, sozinho, o que define quem é pai ou mãe — hoje, a lei olha muito além disso.
Filiação socioafetiva (o amor que cria vínculo)
Sabe aquela pessoa que cria, cuida, educa e está presente na vida da criança, mesmo sem ter laço de sangue?
A lei reconhece essa relação como filiação também.
O afeto gera vínculo jurídico, porque o que realmente importa é quem exerce o papel parental.
Filiação adotiva
Na adoção, o vínculo é criado 100% pela lei, mas com a mesma força e valor da filiação biológica.
Depois da adoção, não existe diferença: filho é filho, e ponto.
Filiação multiparental
Sim, é possível ter mais de um pai ou mãe registrados no documento.
É comum em situações em que a criança tem uma relação sólida com o pai ou mãe socioafetivo, mas também mantém vínculo com o biológico.
A multiparentalidade garante que ninguém seja “apagado” da vida da criança.
E o que tudo isso tem a ver com famílias LGBTQIAPN+?
Tudo.
A diversidade familiar deixou ainda mais claro que ser pai ou mãe vai muito além da biologia.
Casais de duas mães, dois pais, pessoas trans e famílias reconstituídas mostram, no dia a dia, que o cuidado, a presença e o afeto constroem vínculos tão sólidos quanto qualquer teste de DNA.
Em muitos desses lares, a filiação socioafetiva e a multiparentalidade são fundamentais para garantir segurança jurídica para a criança: sobrenome, plano de saúde, herança, escola, decisões médicas, tudo depende do reconhecimento desse vínculo.
Filiação é o reconhecimento jurídico do amor, do cuidado e da responsabilidade.
Não importa se veio do sangue, da adoção, da convivência ou da pluralidade: o Direito das Famílias acompanha essa evolução e garante que todas as formas de amar e criar sejam respeitadas.

Como funciona o registro de nascimento para famílias LGBTQIAPN+ hoje
O registro de nascimento é o documento que coloca a criança no mundo jurídico.
E, felizmente, hoje as famílias LGBTQIAPN+ já têm um caminho muito mais simples, seguro e reconhecido do que há alguns anos. Vamos ao passo a passo — sem juridiquês.
O que a legislação e o STF já garantem
Mesmo que o Brasil ainda não tenha uma lei específica sobre famílias LGBTQIAPN+, as decisões do STF e os atos normativos dos cartórios já garantem:
Direito ao registro de duas mães ou dois pais diretamente no cartório.
Igualdade de tratamento para casais homoafetivos em reprodução assistida.
Reconhecimento da filiação socioafetiva sem discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.
Possibilidade de multiparentalidade quando houver mais de um vínculo parental legítimo (biológico + socioafetivo).
Na prática, isso significa que:
Se vocês são um casal LGBTQIAPN+ e têm um filho, o nome de ambos pode aparecer na certidão desde o primeiro dia.
Casais homoafetivos: duas mães, dois pais — como funciona?
Duas mães
Quando uma das mães engravida por reprodução assistida, o cartório registra automaticamente:
A mãe gestante
A mãe não gestante
Não é preciso entrar com ação judicial.
Basta apresentar:
Declaração de nascido vivo (DNV)
Documento de identidade
Declaração da clínica de reprodução assistida (quando houver)
Dois pais
Nos casos de gestação por técnica de reprodução assistida com barriga solidária (útero de substituição):
O cartório registra ambos os pais diretamente, sem judicialização.
A mulher que empresta o útero não é registrada como mãe.
É necessário apresentar:
Termo de consentimento da gestante
Documentos de todos os envolvidos
Declaração da clínica de reprodução assistida
Comprovação da relação entre os pais (união estável ou casamento ajuda, mas não é obrigatório)
Uso de técnicas de reprodução assistida
Quando a criança nasce de:
Fertilização in vitro
Inseminação artificial
Gestação compartilhada (duas mães)
Gestação por substituição (dois pais)
O dado importante não é o DNA, e sim a intenção de formar família.
Por isso, a Resolução 2.320/2022 do CFM e os Provimentos do CNJ garantem que o cartório faça o registro diretamente, desde que haja documentação básica da clínica e dos responsáveis.

Quando é preciso DNA? E quando não é?
Quando NÃO é preciso DNA
Casais homoafetivos em reprodução assistida
Filiação socioafetiva já construída
Multiparentalidade consensual (todos concordam)
Quando o vínculo é reconhecido por declaração formal e documentos do tratamento
Nesses casos, o DNA se torna irrelevante, porque o vínculo se baseia na vontade parental e no afeto.
Quando pode ser necessário DNA
Quando há dúvida, conflito ou disputa sobre quem é o pai biológico
Quando a pessoa deseja reconhecimento unilateral sem base afetiva comprovada
Quando o registro é contestado no Judiciário
Mesmo assim, o DNA não é obrigatório: o juiz pode reconhecer filiação socioafetiva sem exame genético.
Registro direto no cartório x quando precisa de ação judicial
Registro direto no cartório (sem juiz)
Funciona em 90% dos casos:
Duas mães via reprodução assistida
Dois pais via barriga solidária regularizada
Filiação socioafetiva com consentimento dos responsáveis
Reconhecimento voluntário da multiparentalidade
Uniões estáveis e casamentos homoafetivos
Tudo resolvido na mesa do registrador.
Quando pode exigir ação judicial
Barriga solidária feita fora das regras do CFM (sem parentesco, sem documentação)
Conflito entre os envolvidos (ex.: gestante não consente)
Multiparentalidade sem acordo
Tentativa de incluir ou excluir alguém do registro sem concordância das partes
Casos suspeitos de fraude, tráfico de crianças ou irregularidades médicas
Nesses cenários, o juiz entra para proteger a criança e verificar se tudo foi feito de forma ética e legal.
Hoje, ser uma família LGBTQIA+ no Brasil não impede — e não dificulta — o registro de nascimento.
A lei evoluiu, os cartórios evoluíram, e o entendimento dos tribunais acompanha a realidade:
Onde existe intenção de ser pai ou mãe, existe filiação.
E a criança deve ser protegida com toda a segurança jurídica possível.
Multiparentalidade: quando o amor dá mais de um sobrenome
Se tem algo que as famílias LGBTQIAPN+ ensinam ao Direito, é que amor não cabe em caixinha — e, muitas vezes, não cabe em apenas dois nomes.
É daí que nasce a multiparentalidade, o reconhecimento jurídico de que uma criança pode ter mais de um pai e mais de uma mãe, se isso corresponde à realidade afetiva e ao melhor interesse dela.-
O que é multiparentalidade e por que ela existe
A multiparentalidade acontece quando:
A criança tem mais de um vínculo legítimo, seja biológico, afetivo ou ambos;
Todos os envolvidos exercem função parental real;
O arranjo traz mais estabilidade, cuidado e proteção.
Na prática, o Direito apenas coloca no papel o que já existe na vida real.
Ela existe porque:
Há famílias formadas por mais de duas pessoas no papel de pais/mães;
Crianças criadas por três (ou mais) adultos desenvolvem vínculo igual com todos;
Excluir alguém do registro poderia prejudicar direitos básicos da criança.
É uma forma de o Direito dizer:
Se você cria, cuida e ama, você também importa juridicamente.
Exemplos reais de multiparentalidade
Casal de duas mães + pai biológico
Uma das mães engravida por reprodução assistida caseira ou combinada com amigo do casal.
Todos participam da gravidez, do nascimento e da criação.
Resultado:
registro com três nomes — as duas mães e o pai biológico.
Duas mães + pai socioafetivo
O pai não é biológico, mas:
Cuida,
Educa,
Está presente na rotina da criança.
Com o consentimento das mães, ele pode ser reconhecido como terceiro genitor.
Aqui, o DNA é irrelevante: o que conta é o afeto comprovado.
Três pais (ou pais e mães) que decidem criar juntos
Modelos de famílias plurais em que:
Três pessoas planejam a gestação,
Todas assumem deveres e responsabilidades,
Todas desejam ser reconhecidas como pais/mães.
Esse arranjo já foi reconhecido judicialmente em diversos estados do Brasil.
Em todos esses casos, não há “excesso de pais” — há excesso de cuidado.
Benefícios legais da multiparentalidade
Reconhecer formalmente todos os pais/mães evita burocracia e protege a criança em situações práticas do dia a dia:
Guarda e tomada de decisões: todos têm legitimidade para autorizar viagens, cirurgias, matrícula, etc.
Pensão alimentícia: mais de um responsável pode dividir o sustento — alívio emocional e financeiro.
Herança: a criança herda de todos os seus pais/mães reconhecidos.
Plano de saúde e escola: qualquer um pode incluir a criança como dependente.
Adoção e sucessão: evita disputas e lacunas legais caso algo aconteça com um dos genitores.
O Direito não cria confusão — ele organiza aquilo que já está funcionando na vida real.
Multiparentalidade não é confusão — é reconhecimento
Durante muito tempo, as famílias eram obrigadas a caber em um modelo rígido de “pai + mãe”.
Mas a vida real sempre foi mais diversa.
Hoje, reconhecer multiparentalidade significa:
Respeitar a história daquela criança,
Dar segurança para todos que cuidam dela,
Fortalecer laços que já existem,
Garantir que ninguém que ama e protege fique de fora do registro.
No fundo, é simples:
se a criança tem três amores que a criam, por que colocar só dois no papel?
Quem pode entrar no registro? (O quebra-cabeça explicado)
Se registrar um filho já gera dúvida em famílias tradicionais, imagine nas famílias LGBTQIAPN+ e multiparentais.
A boa notícia? O quebra-cabeça é completamente montável quando entendemos os critérios que o Direito usa.
No fundo, o cartório e a Justiça analisam quatro perguntas:
Quem gerou?
Quem gestou e deu à luz tem, por padrão, vínculo jurídico imediato.
Exemplo:
Casal de duas mulheres: a gestante entra automaticamente no registro.
Gestação compartilhada por reprodução assistida: a gestante continua sendo mãe jurídica.
Quem doou material genético?
A regra é simples: quem doa material genético não vira pai ou mãe automaticamente.
Exemplos:
Amigo que doa sêmen para casal de mulheres: só entra no registro se houver intenção parental reconhecida por todos.
Banco de sêmen/óvulos: sem vínculo jurídico.
O DNA só importa quando:
Há disputa;
Não há acordo;
Existe dúvida sobre quem deve constar.
Nos demais casos, o que manda é a intenção de formar família.
Quem cria?
O Direito olha para a vida real:
quem acorda de madrugada, leva à escola, paga as contas e educa, exerce parentalidade.
E isso vale tanto para:
Duas mães,
Dois pais,
Três pessoas criando juntas,
Padrasto/madrasta que virou referência parental.
Se existe cuidado contínuo, há potencial de reconhecimento.
Quem tem vínculo afetivo duradouro
A afetividade é um dos pilares da filiação contemporânea.
Para entrar no registro como mãe ou pai socioafetivo, geralmente são exigidos:
Convivência estável;
Reconhecimento público da relação parental;
Participação efetiva na vida da criança;
Consentimento dos demais responsáveis.
Ou seja: não basta gostar da criança — é preciso viver a parentalidade.
E na prática? Quem pode entrar no registro?
Quando entram duas mães
Casais femininos têm reconhecimento direto em cartório quando:
Houve reprodução assistida (com ou sem DNA de uma delas);
Ambas declararam a intenção parental;
Existe casamento ou união estável formalizada.
Sem reprodução assistida clínica (ex.: doação caseira), às vezes é necessária ação judicial — mas ambas podem ser reconhecidas.
Quando entram dois pais
Nos casais masculinos:
Se há barriga solidária, ambos podem entrar no registro como pais;
O material genético pode ser de um deles, dos dois ou de doador anônimo — isso não muda o direito ao registro;
A gestante (barriga solidária) não é incluída como mãe, se todos estiverem de acordo.
Quando entram três pessoas
A multiparentalidade permite registros com:
Duas mães + pai biológico;
Duas mães + pai socioafetivo;
Dois pais + mãe gestante;
Três pais que planejaram a gestação juntos.
Quando o padrasto ou a madrasta quer a filiação socioafetiva.
Nesses casos, é quase sempre necessária decisão judicial, porque:
Exige prova de convivência;
Depende do consentimento de todos;
O juiz avalia o melhor interesse da criança.
A boa notícia: os tribunais têm reconhecido com frequência.
Situações que exigem consenso, acordo e prova de afeto
A multiparentalidade só funciona quando há:
Consentimento entre todos os responsáveis;
Intenção parental clara desde o início ou construída ao longo da vida;
Vínculo de afeto evidente, comprovado por fotos, documentos, testemunhas, escola, plano de saúde etc.
Quando existe conflito (ex.: pai biológico que não quer ser incluído, ou mãe que não aceita terceiro genitor), o caso vai para o Judiciário.
Filiação socioafetiva: o direito que abraça todas as famílias
Se tem algo que o Direito das Famílias aprendeu com a vida real é isso:
ser pai ou mãe é muito mais do que genética — é presença, cuidado e afeto.
É aí que entra a filiação socioafetiva, uma das mudanças mais bonitas e humanas do nosso sistema jurídico.
O que é filiação socioafetiva?
É quando a parentalidade nasce do vínculo de convivência, e não do sangue.
Ou seja: é mãe, pai ou responsável quem cria, quem educa, quem ama — independentemente de DNA.
Exemplos simples:
A madrasta que cria a criança desde o berço, enquanto o pai biológico é ausente.
O parceiro do pai em uma família LGBTQIAPN+ que sempre esteve presente nos cuidados.
A amiga que doou óvulos, mas quem exerce a maternidade é a mãe que cria.
A dupla de mães que decide juntas trazer um bebê ao mundo via reprodução assistida.
Em todos esses casos, o vínculo é construído no dia a dia — e a lei reconhece isso.
Como a filiação socioafetiva é reconhecida?
Existem dois caminhos:
Reconhecimento voluntário em cartório
Quando todos estão de acordo e não existe conflito, o pai ou mãe socioafetivo pode ser incluído diretamente no registro.
É rápido, simples e sem processo judicial.
Reconhecimento judicial
Quando há dúvidas, discordâncias ou necessidade de incluir mais de dois genitores, o caso vai ao Judiciário.
Aqui, o juiz analisa:
Convivência contínua;
Relação pública e notória;
Participação real na vida da criança;
Documentos, fotos, conversas, comprovantes de escola e saúde.
A pergunta que o juiz faz é sempre a mesma:
Essa pessoa é figura parental na vida da criança?
Se a resposta for sim, a filiação é reconhecida.
Quando a filiação socioafetiva vira multiparentalidade?
Simples:
Quando a criança já tem pais biológicos reconhecidos, mas também possui vínculo afetivo forte com outra figura parental.
Exemplos clássicos:
Duas mães + pai biológico que sempre participou.
Pai biológico + pai socioafetivo que criou junto.
Três pessoas que planejaram a criança desde o início.
Nesses casos, ninguém precisa ser apagado do registro.
A lei entende que amor não divide — soma.
A força do afeto no Direito das Famílias contemporâneo
A filiação socioafetiva representa uma virada de chave importante:
Garante segurança jurídica para a criança.
Reconhece a realidade das famílias diversas.
Fortalece laços de cuidado e responsabilidade.
Tira do papel a ideia de que paternidade e maternidade são funções, não apenas biologia.
No fundo, é o Direito dizendo:
Se você ama, cuida e cria, você é família.
E isso faz toda a diferença para milhares de crianças e famílias LGBTQIAPN+ que, por anos, viveram sem proteção jurídica.
A filiação socioafetiva é a prova de que o mundo — e a lei — estão aprendendo que família é, antes de tudo, afeto.
Erros e mitos mais comuns (para evitar dor de cabeça!)
Quando o assunto é filiação em famílias LGBTQIAPN+ e multiparentalidade, os mitos correm soltos — e muitos deles causam confusão desnecessária.
Vamos desmontar cada um com calma (e leveza!), para que você navegue esse tema com segurança e informação de verdade.
Mito 1: Só entra quem é biológico.
Verdade: O afeto também cria vínculo jurídico.
Hoje, a filiação socioafetiva é amplamente reconhecida — tanto em cartório quanto judicialmente.
Ou seja: quem cria também pode ser pai ou mãe, mesmo sem compartilhar DNA.
Exemplos reais:
Duas mães que decidem juntas ter um bebê.
Pai socioafetivo que está presente desde o nascimento, mesmo não sendo o biológico.
Mito 2: Multiparentalidade tira direitos de alguém.
Verdade: Ninguém perde — a criança ganha.
A multiparentalidade não substitui um genitor por outro.
Ela soma e garante que todas as figuras parentais sejam reconhecidas.
Direitos como pensão, guarda, sucessão e plano de saúde passam a ser compartilhados, ampliando a proteção e não retirando nada de ninguém.
Mito 3: O cartório não pode registrar duas mães.
Verdade: Pode, sim!
E isso já é prática consolidada no Brasil, especialmente para famílias formadas:
Por reprodução assistida;
Por união estável ou casamento homoafetivo;
Por acordo claro entre as duas mães quanto à intenção parental.
O mesmo vale para dois pais — inclusive em casos de barriga solidária.
Mito 4: É só declarar verbalmente.
Verdade: Reconhecimento de filiação exige formalização.
A declaração verbal não tem efeito jurídico nenhum.
É preciso:
Registro no cartório,
Escritura pública, ou
Decisão judicial.
Afinal, filiação gera direitos e deveres sérios — cuidado, herança, guarda, decisões médicas…
Tudo isso só existe se o vínculo estiver formalizado.
Mito 5: Três pais? Isso é bagunça!
Verdade: Não é bagunça — é vida real.
A multiparentalidade aparece quando a criança tem mais de uma figura parental verdadeira.
E a Justiça reconhece isso para garantir estabilidade e segurança ao menor.
Exemplo:
Duas mães que criam junto com o pai biológico, todos participando ativamente da educação.
Mito 6: Se reconhecer mais de um, vai dar confusão na herança.
Verdade: Não dá confusão — dá clareza.
Com três ou mais genitores, a herança é dividida entre todos os pais e os demais herdeiros.
A regra jurídica é simples e já está preparada para isso.
Quando o assunto é filiação, lembre-se: o maior mito é achar que amor não basta — e o maior erro é não formalizar esse amor.
Como fazer o registro passo a passo (guia Ohana)
Registrar uma criança em uma família LGBTQIAPN+ ou multiparental pode parecer complicado à primeira vista — mas, quando você sabe o caminho, tudo flui com muito mais leveza.
Aqui vai um passo a passo com clareza total, estilo Ohana, para que ninguém seja surpreendido por burocracias.
Documentos necessários
Os documentos variam conforme o tipo de família e o modelo de parentalidade, mas, em geral, o cartório vai pedir:
Para quem vai registrar:
RG e CPF dos pais/mães;
Certidão de casamento ou declaração de união estável (quando houver);
Comprovante de residência.
Do bebê:
Declaração de Nascido Vivo (DNV), fornecida pelo hospital ou pela parteira.
Nos casos de reprodução assistida:
Documento da clínica confirmando o uso da técnica;
Termos de consentimento assinados.
Nos casos de multiparentalidade:
Documentos que comprovem vínculo afetivo e convivência
(fotos, declarações da escola, plano de saúde, testemunhos, etc.).
Como funciona no cartório
O atendimento costuma ser simples e direto — desde que a situação esteja documentada.
Casais LGBTQIAPN+ com duas mães ou dois pais
Comparecem juntos ao cartório.
Apresentam os documentos pessoais + DNV.
Assinam o termo de reconhecimento conjunto da parentalidade.
O nome de ambos é incluído no registro, sem necessidade de ação judicial.
Esse procedimento é especialmente tranquilo quando houve reprodução assistida e a intenção parental é clara.
Casos com barriga solidária (para casais masculinos)
Apresentar o termo de cessão da gestante e os documentos da reprodução assistida.
A gestante não é incluída no registro.
Os dois pais entram como responsáveis legais.
Filiação socioafetiva reconhecida em cartório
Quando todos estão de acordo, o pai ou mãe socioafetivo pode ser incluído diretamente.
O cartório avalia:
Convivência,
Vínculo afetivo,
Consentimento dos responsáveis já registrados.
Se tudo estiver em ordem, o registro é atualizado sem processo.
Quando é preciso entrar com ação judicial
Algumas situações ainda dependem de decisão judicial — e tudo bem! Isso garante segurança jurídica para a criança.
É necessária ação judicial quando:
Há multiparentalidade (três ou mais pessoas no registro);
Há discordância entre os possíveis genitores;
Não existe documento da clínica nas reproduções assistidas caseiras;
O cartório recusa por ausência de comprovação suficiente;
Alguém deseja excluir ou limitar direitos de uma figura parental (o que raramente é autorizado).
Nesses casos, o juiz vai olhar para o melhor interesse da criança, e não só para a biologia.
Dicas práticas para evitar recusas e burocracias
Tenha tudo por escrito
Intenção parental verbal não tem valor jurídico.
Prefira termos assinados, declarações, documentos da clínica e registro de união estável.
Se houve doação de material genético, deixe claro que é sem intenção de parentalidade
Evita questionamentos e protege todas as partes.
Formalize a união estável
Isso facilita muito a vida no cartório.
No caso de multiparentalidade, organize as provas de afeto
Fotos, bilhetes, mensagens, histórico escolar — tudo vale para demonstrar a convivência.
Vá ao cartório antes do nascimento
Converse com o registrador, leve dúvidas, entenda os requisitos.
A maioria dos problemas se resolve com uma conversa prévia.
Procure orientação jurídica
Cada cartório tem nuances. Ter alguém especializado evita desgastes e recusas.
Filiação é amor, responsabilidade e reconhecimento
No fim das contas, filiação não é só biologia — é vínculo, cuidado, presença e responsabilidade. A família, no sentido mais profundo da palavra, é feita por quem estende a mão, quem oferece colo, quem garante proteção e afeto. É esse conjunto de ações que se constrói o verdadeiro significado de ser pai, mãe ou responsável.
Ao reconhecer formalmente um vínculo de filiação, seja ele biológico, socioafetivo ou por adoção, você não está apenas assinando um documento: está garantindo segurança jurídica, estabilidade emocional e acesso a direitos fundamentais que acompanham a criança ou adolescente por toda a vida. Esse reconhecimento é um gesto de amor, mas também um compromisso com o futuro.
Se você está passando por uma situação que envolve reconhecimento de paternidade, maternidade, multiparentalidade ou qualquer questão de filiação, não enfrente isso sozinho. Cada caso tem suas nuances e merece uma análise sensível e profunda.
Busque orientação especializada — um profissional que entenda não apenas a lei, mas também as emoções e impactos que permeiam o Direito das Famílias.
Na Ohana Direito das Famílias, acreditamos que toda história merece cuidado.
Porque, no fim, filiação é isso: amor que se reconhece e responsabilidade que se assume.




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